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Pensamento infantil

Prometer no início do ano letivo, a uma criança de 8 anos, uma bicicleta se esta passar de ano é mais um indicador claro de desconhecimento do pensamento infantil, uma vez que as crianças têm dificuldade em prever o que poderá acontecer e em pensar em termos de futuro.

'Uma professora da pré-primária (...) decidira ensinar aos alunos - crianças de 3 e 4 anos de idade - o conceito de 'ar'. Depois de apresentar a ideia, foi buscar pequenos sacos de plástico e fez dispersar as crianças pela sala em busca desse artigo invisível. Após alguns momentos de tensão, cada criança acabou por apanhar uma certa quantidade de ar; apertaram os sacos, ouviram o som que o ar fazia ao libertar-se e dedicaram-se em seguida a uma série de outras atividades, antes de darem por terminada a aula. 'O ar está em toda a parte', enfatizou a professora uma última vez. Uma semana depois, e com curiosidade em saber o que as crianças haviam aprendido, a professora voltou a distribuir os sacos de plástico. E, mais uma vez, as enviou em busca de ar.
- Nunca supus que tal acontecesse - riu-se mais tarde - mas cada uma delas se dirigiu para o mesmo local em que havia anteriormente encontrado o seu 'ar' e não as consegui convencer de que este poderia estar igualmente noutro lugar qualquer! Creio que o 'ar' é mais abstrato do que julgava!'

'O que farias se tivesses um pincel mágico que desse vida a tudo o que pintasses?', Jane M. Healy, Difusão Cultural.

A experiência desta educadora ilustra bem a dificuldade que os adultos por vezes têm em compreender que as crianças têm um raciocínio diferente dos adultos. O pensamento das crianças é mais concreto e baseia-se nas suas vivências e associações pessoais. Quanto mais nova for a criança, mais dificuldade terá em compreender conceitos abstratos.

A compreensão do ponto de vista do outro é outra competência que as crianças não têm tão desenvolvida como o adulto. Para elas, é difícil não só criar empatia com os sentimentos alheios, mas também compreender as razões subjacentes a determinados atos e opiniões. A criança está muito centrada nela própria e na experiência do 'aqui e agora'.

Prometer no início do ano letivo, a uma criança de 8 anos, uma bicicleta se esta passar de ano é mais um indicador claro de desconhecimento do pensamento infantil, uma vez que as crianças têm dificuldade em prever o que poderá acontecer e em pensar em termos de futuro. Para a criança é difícil planear com antecedência um dia, quanto mais um ano inteiro.

As questões de natureza moral e ética dada a sua complexidade e grau de abstração são encaradas pela criança de uma forma muito pessoal. Se perguntar a uma criança de 7 anos 'Porque é que não se deve roubar?', ela provavelmente dará uma resposta característica da sua idade: 'Porque se me roubassem os meus brinquedos eu ficaria triste'.

Uma outra noção de difícil compreensão para a criança é a de causa e efeito. Para o adulto, é evidente que um determinado efeito tem por detrás uma causa concreta. Para a criança, o que está subjacente ao efeito pode não ser muito claro. Uma criança que pede aos pais 'quero tocar violino', não tem a noção das implicações que o seu desejo tem. Para ela é difícil antecipar que quem toca violino tem de treinar muito e que isso provoca cansaço e por vezes aborrecimento.

Todos os exemplos apresentados demonstram que quem quiser conversar com as crianças tem de pôr de lado as suas convicções e tentar entrar em sintonia com o seu raciocínio. Se assim o fizer, vai tornar-se mais divertido conversar com os mais pequenos e o relacionamento com eles irá certamente melhorar.


ADRIANA CAMPOS
Licenciada em Psicologia pela Universidade do Porto, na área da Consulta Psicológica de Jovens e Adultos e mestre em Psicologia Escolar. Detentora da especialidade em Psicologia da Educação e das especialidades avançadas em Necessidades Educativas Especiais e Psicologia Vocacional e de Desenvolvimento da Carreira atribuída pela Ordem dos Psicólogos Portugueses. Atualmente desenvolve a sua atividade profissional no Agrupamento de Escolas do Padrão da Légua em Matosinhos.

Artigo originalmente publicado no Educare.pt

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